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Tráfico convocou moradores para desarticular operação policial no Complexo do Alemão
18 pessoas morreram nos confrontos desta quinta-feira (21) no Complexo do Alemão, sendo 16 suspeitos, uma moradora e um policial| Foto: Rafael Campos/Governo RJ

Durante a operação policial desta quinta-feira (21) no Complexo do Alemão, zona norte do Rio de Janeiro, lideranças do narcotráfico ligadas ao Comando Vermelho convocaram moradores para fazer uma mobilização com centenas de motocicletas na área em que estavam ocorrendo os confrontos armados a fim de desmobilizar as ações policiais e facilitar a fuga dos criminosos. Segundo a Polícia Militar do Rio de Janeiro (PMERJ), 43 motos utilizadas nessa ação foram apreendidas.

A convocação ocorreu principalmente por meio de grupos em aplicativos de mensagens e pelas redes sociais, mas conforme apuração da reportagem, alguns moradores foram abordados pessoalmente sob ameaças para participarem dos atos.

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A operação policial, executada por integrantes do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar, e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) da Polícia Civil, teve como objetivo desarticular um grupo criminoso responsável por roubos de veículos, cargas e combustíveis e tentativas de roubos a agências bancárias. O confronto entre policiais e traficantes deixou ao todo 18 mortos, sendo 16 suspeitos, uma inocente e um policial militar.

Para resistir à ação policial, criminosos chegaram a usar metralhadora ponto 50 (armamento com capacidade para perfurar blindagens, frequentemente utilizado para neutralizar aviões – veja o vídeo), lançaram granadas contra os policiais, jogaram óleo nas vias e usaram dezenas de barricadas para impedir o avanço dos blindados. Os traficantes também lançaram mão de rajadas de metralhadoras a esmo em meio a conjuntos residenciais, colocando em risco moradores dentro de suas casas. As forças de segurança chegaram a apreender diversos fardamentos e artigos militares iguais aos usados pelas tropas especiais das polícias do estado.

Nesta sexta-feira (23), uma moradora morreu após ser baleada enquanto caminhava por um beco próximo à Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) Nova Brasília. A unidade foi atacada a tiros por criminosos pela manhã, e após cessarem os disparos a vítima foi encontrada ferida. Ela foi levada ao hospital, mas já chegou ao local sem vida. Segundo a PM, os policiais que estavam na unidade não revidaram o ataque.

Moradores de outras favelas chegaram para ajudar traficantes

No início da manhã de ontem, um perfil nas redes sociais com mais de 16 mil seguidores fez uma postagem pedindo para “os amigos de todas as áreas mandarem motocicletas para o complexo do alemão” devido à operação policial. Outros perfis compartilharam esta e outras mensagens convocando a mobilização. A movimentação de motocicletas em meio ao confronto armado foi tão grande que a PMERJ chegou a alertar em seus canais digitais que veículos irregulares que estivessem compondo o ato para favorecer fuga de lideranças do crime organizado seriam apreendidas.

À Gazeta do Povo, o delegado Fabrício Pereira, coordenador da Coordenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro (Core/PCERJ), afirmou que os motociclistas se deslocaram de outras favelas por ordem do tráfico. Segundo o delegado, a convocação de moradores para tais atos é comum em operações policiais nas comunidades dominadas pelo crime organizado.

“É uma parcela da população que mora na favela que é utilizada como massa de manobra pra fazer esses protestos. Quando está havendo confronto e a polícia está numa extremidade de uma rua e os criminosos na outra, por exemplo, essas pessoas entram de moto em meio ao confronto. Eles se colocam em risco, mas sabem que a polícia não vai atirar. E nessa confusão o criminoso se mistura com o motociclista, esconde a arma e foge”, diz o coordenador da Core.

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O delegado explica que, no ato desta quinta-feira, parte do grupo era composto por mototaxistas que trabalham em áreas dominadas pelo crime organizado e precisam ter autorização das facções para trabalhar. “Uma parte é compelida porque se ele não se colocar em posição de ajudar ele pode perder o emprego ou pode até ser morto. Mas há também a parte da população que é simpática ao tráfico e participa dessas mobilizações”, afirma.

Sobre as mobilizações, a PM carioca informou que “lançar jovens armados em confronto com a Polícia e utilizar públicos não armados para desviar a atenção das operações são estratégias dos líderes do tráfico desta facção para garantirem sua fuga”. A corporação informou que o chamamento ocorreu no momento em que duas lideranças influentes do crime no Complexo do Alemão estavam feridas e/ou encurraladas.

Veja abaixo vídeo que mostra os motociclistas se deslocando:

Policial morto por traficantes tinha dois filhos autistas

O cabo da PM Bruno de Paula Costa foi morto por criminosos ligados ao crime organizado logo no início da operação, quando traficantes atacaram a base da UPP Nova Brasília, unidade em que o policial trabalhava. Ele foi levado ao Hospital Estadual Getúlio Vargas, mas não resistiu aos ferimentos. O policial tinha 38 anos e deixa a esposa e dois filhos portadores do espectro autista. Outro policial militar ficou ferido após levar um tiro no pé, mas está fora de perigo.

 Cabo da PM Bruno de Paula Costa, morto em confronto no Complexo do Alemão (Foto: PMERJ)
Cabo da PM Bruno de Paula Costa, morto em confronto no Complexo do Alemão (Foto: PMERJ)

Bolsonaro lamenta morte de PM e questiona restrições do STF às operações

Em transmissão ao vivo na noite desta quinta-feira, o presidente Jair Bolsonaro (PL) homenageou o policial assassinado e criticou as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, que tramita na Corte.

A ação, conhecida como “ADPF das Favelas”, gerou restrições progressivas às operações policiais no Rio de Janeiro a partir de junho de 2020. Dentre as várias determinações do Supremo estão a proibição a operações nas comunidades durante a vigência da pandemia, exceto em casos “absolutamente excepcionais”; vedação do uso de helicópteros; instalação de câmeras nas fardas dos policiais; dentre outros.

“Hoje o Rio de Janeiro tem área de exclusão onde a polícia militar não pode agir por decisão do STF. E a bandidagem cresce nessa área, e a PM fica em dificuldade para combater esses marginais”, disse Bolsonaro. “Essas áreas são protegidas por decisão do STF, e quanto mais protegidas, melhores armados eles vão ficando e quando entram em ação o lado de cá, que é o lado da lei, por muitas vezes sofre baixas”, continuou.

Parte das restrições aplicadas pelo Supremo é alvo de críticas de especialistas, que apontam riscos à segurança pública com a suspensão das operações. Recentemente, o secretário de Polícia Militar do estado, coronel Luiz Henrique Marinho Pires, atribuiu ao STF a culpa pela migração de criminosos de outros estados para o Rio de Janeiro, os quais estariam se sentindo protegidos diante da decisão da Corte de restringir as ações policiais.

Na operação da Vila Cruzeiro, no final de maio, ao menos duas lideranças do Comando Vermelho de estados das regiões Norte e Nordeste que estavam abrigadas no Rio de Janeiro foram mortas em confronto. Na operação desta quinta-feira, um criminoso do Pará conhecido como “esquilo doido” e “matador de policiais”, que estava escondido no Complexo do Alemão, foi preso pela polícia.

O governador do Rio de Janeiro também se manifestou sobre o episódio e lamentou a morte do policial. “Nossas forças de segurança foram covardemente atacadas hoje cedo durante uma grande operação no Complexo do Alemão para prender criminosos”, disse Cláudio Castro (PL) no Twitter. “Não vamos recuar na missão de garantir paz e segurança ao povo do nosso estado”, prosseguiu.

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